as horas em tons de luz

Três coisas:



1. As 7h
A luz das primeiras manhãs de outono. Perfeita. Perfeitas.

2. As 15h

O conforto da canela, das raspas de laranja, dos marmelos, das pêras, das abóboras, das panelas de ferro fundido, das colheres de pau, das conversas, o aroma das especiarias. A cozinha. O outono na cozinha.

3.  As 20h

Há uns anos atrás, uma amiga d'alma disse-me que ultrapassa o vazio dos fins de tarde de domingo procurando aconchego nos domingos dos outros. nas janelas das casas. nas famílias a jantar, a ver televisão, a cozinhar.

Só mais tarde, quando também os meus fins de domingo eram passados no banco rodado do autocarro, percebi o que ela disse.

A luz acesa através de uma janela, os contornos, tudo a acontecer para lá do autocarro. Para lá da impessoalidade de um banco por onde já passaram muitos rabos, para lá das conversas que não nos interessam, dos perfumes que não queremos sentir, da companhia do lado que não conhecemos e que às vezes não queremos conhecer. aliás, queremos apenas que fique quieta.

Para lá de tudo o que representa um autocarro quando se viaja sozinho e se sabe que nesse mesmo momento há uma janela. a nossa janela. a janela onde estão as nossas pessoas a cozinhar, a ver televisão, a jantar ou talvez apenas a partilhar um silêncio.

Através da janela do autocarro também eu aprendi a encontrar o meu aconchego nas janelas dos outros. 

Esta é a minha janela, varanda, ou o que lhe quiserem chamar. É domingo. Lá dentro estão as minhas pessoas. De todo o conforto que procurei, esta é a luz que genuinamente me envolve a alma e a aquece.

Agora, se me permitem... vou entrar.